“Sou
eu, assimétrico, artesão, anterior
– na infância, no inferno.” (...)
Herberto Helder – na infância, no inferno.” (...)
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Keytielle Mendonça com a série: “Os punhos de
Leonello, ou qualquer que seja homem” (2012) traz-nos uma delicada poética
áspera. Bem como nos diz Herberto Helder, nos versos da epígrafe, uma alvura de
infância mas permeada pelo o que há
de inferno na vida conjugada de um
adulto. Sobressaiu-se, embora o título, a atenção que tomou-me as aparições das
mãos. Elas, construtoras e destruidoras, que retêm e que repartem, ou como bem
coloca Drummond no poema homônimo “A mão
cresce e pinta/ o que não é para ser pintado mas sofrido.” (...). Em um dos
tecidos bordados, que lembraram-me alguns trabalhos de Leonilson, os dizeres “um homem sofre/ porque tudo faz/ a
partir dos Punhos”, subitamente
remeteu-me a divagar por uma das peças de Nelson Rodrigues, “A Senhora dos Afogados”
(1947), que traz uma imagem tortuosamente poética e bela, bela como a mais horrenda
beleza que imprimiria um Edgar Allan Poe – o amor de Moema por seu pai, Misael,
sentimento fadado ao sofrimento e que tem como espelho do impossível, como prolongamento
eterno do cordão umbilical, a semelhança das mãos e dos gestos delas com as de
sua mãe, D. Eduarda. Esta relação extrema do que os gestos preservam, como
hieróglifos a espera de um leitor que os desvendem, na peça e nas obras de
Mendonça, vibram. Mas que se não o encontra, revela-se com uma fúria suprema,
incontida na delicadeza estética. Poderia eu erroneamente creditar maior
sofrimento ao homem, se baseado na metáfora que Mendonça utilizou; e, dessa
forma, parecer até mais vil tal imagem, a dos punhos? Não consigo afastar a
ideia de que os punhos apenas sustentam as intenções que as mãos executam,
sejam elas, por homens ou mulheres, as mais atrozes ou, de leveza, puras. Dito
isto, recupero o que Italo Calvino em “Seis propostas para o próximo milênio”,
no capítulo que dedica à Leveza, nos
diz em uma de suas passagens acerca do romance “A insustentável leveza do ser”,
de Milan Kundera:
“O
romance nos mostra como, na vida, tudo aquilo que escolhemos e apreciamos pela
leveza acaba bem cedo se revelando de um peso insustentável. Apenas, talvez, a
vivacidade e a mobilidade da inteligência escapam da condenação.” (p. 19,
Tradução de Ivo Barroso, Companhia das Letras, 1990).
Eis
que assim, leve mas cortante como uma lâmina afiada se construiu em mim,
inúmeros significados, que por delongas angustiantes não ousaria retardar o
recesso de minhas inquietudes. Inquietudes e divagações hiperbolizadas com a
exposição de duas outras obras do amigo e artista Sérgio Nunes.
Sua
obra intitulada Íntimo (2011), gavetas
de um mesmo padrão mas trabalhando de forma diferente entre si a profundidade
na concepção de como foram fixadas direto na parede, desnudas, sem nada dentro
e ao mesmo tempo abarcando tudo. O que é o vazio desmistificado? A íntima
sensação de se adentrar gavetas onde se encerravam objetos, ou simples
memórias. Agora vestindo a pele nua da parede, elas, como escamas, provocantes,
querendo chamar as nossas mãos para preenchê-las, deslocá-las na intimidade de
seu vazio-pleno de parede, que nada encerra, só projeta, no oco delírio que o
vazio revela. Em consonância, ao lado, a obra sem título (2011), matematicamente calculada: pedaços do que seria
um tapete de madeira, recortados e orquestrados a compor um desenho em
contraponto ao branco da parede, sempre partindo de um desenho maior de sete
peças, unido a outro menor de 3 peças, repetida a série até um total de 47
fragmentos. E por mais que possam suscitar inúmeras leituras, ficou-me a imagem
do som que se propaga. Ondas sonoras, o oco, eco, os passos que horizontalizaram-se e que nada mais ressoam. E é música.
Um passeio pelo espaço, uma monotonia que chega a ser ruidosa, trágica como, cito meus versos...
Andar e ter
Da
alma escapando
Passo
a passoAté o corpo ser
O oco do próprio
Alex Dias
Ribeirão Preto, 23/03/2012, 00h17
Ribeirão Preto, 23/03/2012, 00h17
Foto da esquerda: Keytielle Mendonça, da série "Os punhos de Leonello, ou qualquer que seja homem" (2012) Foto da direita: Sérgio Nunes, obras: "Sem título" e "Íntimo" (ambas de 2011) |
Serviço:
Artistas selecionados no Programa Exposições 2012
MARP - Museu de Arte de Ribeirão Preto Pedro Manuel-Gismondi
Unidade Centro de Convenções Ribeirão Preto
Rua Bernardino de Campos, 999 - Ribeirão Preto - SP
Permanência até 20/04/2012
Informações no MARP: (016) 3635-2421
Artistas selecionados no Programa Exposições 2012
MARP - Museu de Arte de Ribeirão Preto Pedro Manuel-Gismondi
Unidade Centro de Convenções Ribeirão Preto
Rua Bernardino de Campos, 999 - Ribeirão Preto - SP
Permanência até 20/04/2012
Informações no MARP: (016) 3635-2421